A CRIMINALIZAÇÃO DO NÃO RECOLHIMENTO DE ICMS DECLARADO. DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
No final do ano de 2019, o Supremo Tribunal Federal, julgando o Recurso Ordinário em Habeas Corpus – RHC Nº 163.334, decidiu, por 7 votos a 3, enquadrar como crime o não pagamento do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), devidamente declarado.
O STF atribuiu nova interpretação ao inciso II, do artigo 2º da Lei nº 8.137/1990, que considera crime contra a ordem tributária “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos.
Trata-se, portanto, de uma importante mudança na jurisprudência, que, até então, não considerava como crime e muito menos como hipótese de responsabilização pessoal o simples inadimplemento do tributo devido.
O conteúdo do julgamento (acórdão) ainda não foi publicado, mas na sessão de julgamento os Ministros fizeram referência às obrigações de ICMS não pagas de forma reiterada, em que o contribuinte é classificado como “devedor contumaz”, e também à intenção (dolo) de apropriação do ICMS.
Em verdade, tal julgamento não nos surpreendeu, pois ele está em linha com o julgado no Recurso Extraordinário nº 574.706, em que o STF, decidindo pela inconstitucionalidade da inclusão do ICMS nas bases de cálculo do PIS e da COFINS, julgou que o ICMS incluído no faturamento não pertenceria ao contribuinte, mas sim ao Estado, e por essa simples razão não poderia ser tributado como receita pelas Contribuições ao PIS e COFINS.
Agora, adotando a mesma linha de raciocínio, o STF decidiu que quando o contribuinte cobra tal valor no preço da mercadoria, o declara e não recolhe, ele está praticando crime contra a ordem tributária, pois se apropriou de uma receita do Estado.
Resta saber, agora, após a publicação do Acórdão, se o enquadramento como crime está restrito às hipóteses do devedor contumaz e se também vai exigir prova de intenção de apropriação da quantia, pelo não contribuinte, o que, em nossa opinião, deve efetivamente acontecer.
Em tese, portanto, aqueles devedores que sofrem os efeitos devidamente comprovados da crise econômica ou que estão em situação pré-falimentar ou, ainda, em recuperação judicial, que não recolherem o ICMS, não estariam sujeitos à criminalização por estar ausente o dolo/intenção.
O nosso Escritório está acompanhando de perto o desenvolvimento deste tema e vem assessorando os seus clientes e parceiros sobre o assunto.
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IMUNIDADE DAS ENTIDADES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E A FINALIZAÇÃO DO JULGAMENTO DO STF.
No final do ano, também, o STF retomou o julgamento dos Embargos de Declaração apresentados no Recurso Extraordinário nº 566.622e nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 2.028, 2.036, 2.228 e 2.621, que tratam da competência legislativa para tratar sobre a imunidade das entidades beneficentes de assistência social.
O STF reconheceu expressamente que os requisitos da imunidade prevista no §7º, do artigo 195 da Constituição Federal, devem ser definidos por Lei Complementar e que, atualmente, esse papel é exercido pelo artigo 14 do Código Tributário Nacional.
Dessa forma, na prática, todos os requisitos para a certificação das Entidades, conhecidos como o CEBAS – Certificado de Entidades Beneficentes de Assistência Social, anteriormente constantes na Lei nº 8.212/1991, objeto de julgamento pelo STF, não poderiam comprometer a imunidade da Entidade Beneficente de Assistência Social que cumprisse o artigo 14 do CTN.
Importante ressaltar que o julgamento do STF representou uma mudança em sua jurisprudência, que sempre se posicionou no sentido de que a Lei Ordinária poderia criar procedimentos/contrapartidas a serem seguidas pelas Entidades.
Contudo, na medida em que as contrapartidas/requisitos, na prática, inviabilizavam o gozo da imunidade, o STF reconheceu que os requisitos devem ser veiculados por Lei Complementar.
Pois bem. No julgamento dos Embargos de Declaração, o STF, de uma certa forma, deu um passo atrás, pois decidiu que o inciso II, do artigo 55 da Lei nº 8.212/1991 seria constitucional, que trata justamente de requisitos da Certificação.
Com essa decisão, o STF preservou a Lei nº 12.101/2009, que não havia sido objeto de julgamento e que trata do CEBAS, e adotou sua antiga jurisprudência de permitir a veiculação de contrapartidas por Lei Ordinária.
Contudo, em nosso pensar, o STF criou uma situação jurídica, no mínimo, contraditória, pois ao decidir que a imunidade deve ser regulada por Lei Complementar os únicos requisitos aceitáveis seriam os do artigo 14 do CTN, de modo que não haveria contrapartidas a serem fixadas por Lei Ordinária.
Em suma, entendemos que o julgamento dos Embargos de Declaração em nada altera o julgamento anterior, pois, em nosso entendimento, o STF pretendeu preservar a certificação das entidades, prevista na Lei nº 12.101/2009, que, por conta de sua jurisprudência, não constituirá mais requisito para o gozo da imunidade.
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