Introdução
No dia 16 de abril de 2020, foi publicada no Diário Oficial da União, a Portaria 9.917, de 14 de abril de 2020, expedida pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional – PGFN.
Referido ato normativo, foi editado com o objetivo de disciplinar os procedimentos, os requisitos e as condições necessárias à realização da transação na cobrança de dívidas tributárias, tal como previsto na recém editada Lei 13.988/2020, dívidas estas cuja inscrição e administração caibam à PGFN.
Objetivos
Os objetivos perseguidos pela portaria em análise (artigo 3º), podem ser resumidos em apenas 3, sendo:
- viabilizar, o tanto quanto se mostre possível, a superação da crise econômico-financeira, advinda dos danosos efeitos desencadeados pela pandemia de COVID-19 no cenário econômico brasileiro, de modo a preservar a empresa, sua função social e fomentar a atividade produtiva;
- Promover a arrecadação a partir de fontes sustentáveis de recursos e;
- Assegurar o emprego dos trabalhadores brasileiros.
Modalidades de Transação
A portaria prevê 3 modalidades de transação, sendo:
- Transação por adesão à proposta da PGFN, aplicada nos casos cujo valor consolidado dos débitos, seja igual ou inferior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões), apurado a partir do somatório de todas as inscrições;
- Transação individual, proposta por iniciativa da PGFN;
Esta modalidade tem aplicabilidade aos:
- Devedores cujo valor consolidado dos débitos inscritos em dívida ativa da União for superior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais);
- Devedores falidos, em recuperação judicial ou extrajudicial, em liquidação judicial ou extrajudicial ou em intervenção extrajudicial;
- Estados, Distrito Federal e Municípios e respectivas entidades de direito público da administração indireta;
- Débitos cujo valor consolidado seja igual ou superior a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) e que estejam suspensos por decisão judicial ou garantidos por penhora, carta de fiança ou seguro garantia
- Transação individual, proposta por iniciativa do devedor inscrito na dívida ativa.
Para aplicação desta modalidade, a portaria exige que a proposta de transação apresentada, contenha plano de recuperação fiscal com a descrição dos meios para a extinção dos créditos inscritos em dívida ativa da União e, ainda:
- A exposição das causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira;
- A qualificação completa do requerente e, no caso de requerente pessoa jurídica, de seus sócios, controladores, administradores, gestores e representantes legais;
- As demonstrações contábeis relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável;
- A relação nominal completa dos credores, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço de cada um, a natureza, a classificação e o valor atualizado do crédito, discriminando sua origem, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente;
- A relação de bens e direitos de propriedade do requerente, no país ou no exterior, com a respectiva localização e destinação, com apresentação de laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos, subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada;
- Os extratos atualizados das contas do devedor e de suas eventuais aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive em fundos de investimento ou em bolsas de valores, no país ou no exterior, emitidos por instituições financeiras ou equiparadas, a exemplo de bancos de qualquer espécie, distribuidora de valores mobiliários, corretoras de câmbio e de valores mobiliários, sociedades de crédito, financiamento e investimentos, sociedades de crédito imobiliário, administradoras de cartões de crédito, sociedades de arrendamento mercantil, administradoras de mercado de balcão organizado, cooperativas de crédito, associações de poupança e empréstimo, bolsas de valores e de mercadorias e futuros, entidades de liquidação e compensação, instituições de microcréditos, seguradoras, sociedades de capitalização, entidades de previdência privada, gestoras de recursos, empresas de fomento comercial, empresas de factoring ou outras sociedades que, em razão da natureza de suas operações, assim venham a ser consideradas pelo Conselho Monetário Nacional;
- Descrição das operações realizadas com as instituições descritas no inciso anterior, inclusive operações de crédito com ou sem garantias pessoais, reais ou fidejussórias, contratos de alienação ou cessão fiduciária em garantia, inclusive cessão fiduciária de direitos creditórios ou de recebíveis;
- Relação dos bens particulares dos controladores, administradores, gestores e representantes legais do sujeito passivo e o respectivo instrumento, inclusive cotas e participações em empresas ou fundos, discriminando a data de sua aquisição, o seu valor atual estimado e a existência de algum ônus, encargo ou restrição de penhora ou alienação, legal ou convencional, neste último caso com a indicação da data de sua constituição e das pessoas a quem favoreça;
- A relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados;
- Declaração de que o sujeito passivo ou responsável tributário, durante o cumprimento do acordo, não alienará bens ou direitos sem proceder à devida comunicação à Fazenda Nacional;
- Exposição de que o plano de recuperação observa as obrigações, exigências e concessões previstas nesta Portaria e está adequado à sua situação econômico-financeira;
- Relação de bens e direitos que comporão as garantias do termo de transação, inclusive de terceiros, observado o disposto nos arts. 9º e 10 da Portaria PGFN nº 33, de 08 de fevereiro de 2018;
- Declarar que não utiliza ou reconhecer a utilização de pessoa natural ou jurídica interposta para ocultar ou dissimular a origem ou a destinação de bens, de direitos e de valores, seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários de seus atos, em prejuízo da Fazenda Pública Federal;
- Declarar que não alienou ou onerou bens ou direitos com o propósito de frustrar a recuperação dos créditos inscritos ou reconhecer a alienação ou oneração com o mesmo propósito.
- Uma vez que a soma das dívidas inscritas ultrapasse o valor limite de R$ 15.000.000,00, somente será admissível a transação individual.
Exigências para Realização da Transação
A PGFN poderá condicionar a realização da transação às exigências previstas no artigo 7º da portaria em análise, tais como:
- Pagamento de entrada mínima como condição à adesão;
- Manutenção das garantias associadas aos débitos transacionados, quando a transação envolver parcelamento, moratória ou diferimento;
- Apresentação de garantias reais ou fidejussórias, inclusive alienação fiduciária sobre bens móveis ou imóveis e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, títulos de crédito, direitos creditórios ou recebíveis futuros;
- Possibilidade de utilização de créditos líquidos e certos do contribuinte em desfavor da União, reconhecidos em decisão transitada em julgado, ou de precatórios federais próprios ou de terceiros, para fins de amortização ou liquidação de saldo devedor transacionado
Das Concessões
A PGFN, ao seu exclusivo critério, poderá conceder aos devedores, nas transações realizadas, as seguintes vantagens:
- Descontos aos débitos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação;
- Possibilidade de parcelamento;
- Possibilidade de diferimento ou moratória;
- Flexibilização das regras para aceitação, avaliação, substituição e liberação de garantias;
- Flexibilização das regras para constrição ou alienação de bens.
Efeitos das Transações
A proposta de transação, em qualquer de suas modalidades, somente implicará na suspensão da exigibilidade dos créditos transacionados, bem como, na suspensão do andamento das respectivas execuções fiscais, quando o devedor cumprir com aquilo que lhe competir na transação e quando a PGFN aceitar a proposta.
A formalização do acordo de transação, quando envolver a concessão das vantagens afetas a descontos, parcelamento, diferimento ou moratória, configura ato manifesto de reconhecimento dos débitos transacionados. A extinção dos débitos, objeto da transação, dar-se-á quando do cumprimento integral dos termos ajustados no momento da aceitação do acordo.
Das Proibições da Transação
A transação ajustada entre o devedor e a PGFN, não poderá versar sobre:
- Redução do montante principal do crédito;
- Redução das multas de natureza penal;
- Redução superior a 50% (cinquenta por cento) do valor total dos créditos a serem transacionados;
- Concessão de prazo de quitação dos créditos superior a 84 (oitenta e quatro) meses;
- Créditos não inscritos em dívida ativa da União;
- Concessão de descontos a créditos que dizem respeito a Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – Simples Nacional, enquanto não editada Lei Complementar autorizativa e ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), enquanto não autorizado pelo seu Conselho Curador mediante Resolução;
- Transação proposta por devedor contumaz, conforme definido em lei específica.
Ainda, é possível ao devedor, na transação por adesão à proposta da PGFN, combinar uma ou mais modalidades disponíveis, de forma a equacionar todo o passivo fiscal.
Rescisão da Transação
A transação convencionada entre o devedor e a PGFN, poderá ser rescindida nas seguintes hipóteses:
- Descumprimento das condições, das cláusulas, das obrigações ou dos compromissos assumidos;
- Constatação, pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, de ato tendente ao esvaziamento patrimonial do devedor como forma de fraudar o cumprimento da transação, ainda que realizado anteriormente a sua celebração;
- Decretação de falência ou de extinção, pela liquidação, da pessoa jurídica transigente;
- Comprovação de prevaricação, de concussão ou de corrupção passiva na sua formação;
- Ocorrência de dolo, de fraude, de simulação ou de erro essencial quanto a pessoa ou quanto ao objeto do conflito;
- Ocorrência de alguma das hipóteses rescisórias adicionalmente previstas no respectivo termo de transação;
- Inobservância de quaisquer disposições previstas na Lei de regência da transação ou no edital.
A portaria da PGFN assevera, ainda, que, caso não seja regularizado o vício, deverá ser oportunizado ao devedor que teve a transação rescindida, a possibilidade de apresentar impugnação à rescisão. Da decisão que apreciar a impugnação apresentada, caberá recurso administrativo.
Da Possibilidade de Utilização de Créditos Líquidos e Certos e de Precatórios Federais para Amortização do Saldo Devedor Transacionado
Por fim, a portaria estabelece a possibilidade de utilização de créditos líquidos e certos em desfavor da União, reconhecidos em decisão judicial transitada em julgado, ou precatórios federais, próprios ou de terceiros, para amortizar ou liquidar saldo devedor transacionado, incumbindo ao devedor o atendimento de algumas exigências.
O momento vivenciado por todos os brasileiros na atual conjuntura, marcada, principalmente, pelo enfrentamento à pandemia de corona vírus (COVID-19), ensejou diversas e necessárias alterações legislativas, notadamente, em questões tributárias, conferindo, assim, às autoridades fazendárias, a tarefa de regulamentar as Leis editadas.
Deste modo, todas as decisões a serem tomadas no contexto da atividade empresarial, considerando, além das referidas alterações e atos normativos regulamentares, os possíveis cenários econômicos que podem emergir, devem ser previamente discutidas e estrategicamente planejadas.
Assim, nós, do escritório Sawaya e Matsumoto Advogados, recomendamos aos nossos clientes e demais interessados, que seja feita uma análise técnico-jurídica acerca das particularidades de cada caso pelo nosso corpo de advogados.
Por fim, nos colocamos à disposição para ajudá-los a tomar as melhores decisões em tempos como esses.